Em razão da pandemia de Covid-19, muitas decisões judiciais estão sendo proferidas em matéria de alimentos, notadamente nas questões relacionadas à execução de alimentos sob o rito de prisão do devedor obrigado a prestar alimentos.
O STJ, em 26 de março de 2020, ao analisar pedido formulado pela Defensoria Pública da União, estendeu os efeitos de liminar concedida para o estado do Ceará, de forma a valer, em todo território nacional, em caráter excepcional, a determinação de que o cumprimento de prisão decorrente de dívida alimentar seja feito em regime domiciliar.
O ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator do Habeas Corpus 568.021, ao conceder o pedido, ressaltou “que as condições de cumprimento da prisão domiciliar serão estipuladas pelos juízos de execução de alimentos, inclusive em relação à duração, levando em conta as medidas adotadas pelo governo federal e local para conter a pandemia da Covid-19”. Por fim, salientou que a decisão não revoga a adoção de medidas mais benéficas eventualmente já determinadas pelos juízos locais.
Além do tema relacionado ao cumprimento de prisão dos devedores de alimentos, questão aparentemente superada pela decisão acima informada, outra matéria que deve merecer pronto posicionamento do Judiciário é a da premente necessidade de ingresso de ação revisional de alimentos por aqueles que estão obrigados, por decisões judiciais, a prestarem alimentos a terceiros.
Diante da situação vivida em tempos de pandemia, se torna evidente que, na maioria dos casos, haverá uma abrupta diminuição de ganho financeiro por parte de empregados, empresários e demais trabalhadores, o que corresponderá a dizer que a capacidade financeira daquele que presta alimentos sofrerá diminuição.
O artigo 1.699, do Código Civil, prescreve que:
“Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo.”
Já a Lei 5.478/68 (Lei de Alimentos), no seu artigo 15, estipula que:
“A decisão judicial sobre alimentos não transita em julgado e pode a qualquer tempo ser revista, em face da modificação da situação financeira dos interessados.”
Nessa mesma linha é o comando contido no artigo 505, do Código de Processo Civil em vigor:
“Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:
I – se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito, caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
II – nos demais casos prescritos em lei.”
Tudo nos leva a crer que a alteração da capacidade financeira daqueles que se encontram obrigados à prestação de alimentos já está sendo diretamente afetada pelo atual cenário que enfrentamos. A diminuição de seus ganhos, ao menos nos primeiros meses, será inevitável.
De outro lado, a necessidade da pessoa que recebe os alimentos permanecerá a mesma.
Eis a questão. O que deverá ser feito?
O prudente será que as partes envolvidas nessa relação busquem consensualmente a melhor forma de solucionar a equação, evitando-se delongas e prejuízos maiores aos dois lados.
Contudo, em matéria de Direito de Família, o racional nem sempre é possível de prevalecer. Assim, outra alternativa não restará que não o ingresso em juízo da ação revisional de alimentos.
E nesse ponto, mais do que nunca, haverá necessidade de o Poder Judiciário se manifestar não só com a cautela que o caso exige, mas, principalmente, com a agilidade que a situação reclama, sob pena de nos vermos diante de uma situação que motivará o endividamento maior das pessoas, o que gerará um maior número de proposituras de execução alimentar, cujo resultado, aparentemente, será inócuo.
Que as luzes do bom Direito nos iluminem!
Fonte: Renato de Mello Almada – Migalhas.com.br